sexta-feira, 25 de julho de 2008

Cartas de condução em falta

O Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMMT) calculou que tivessem desaparecido 73 mil pedidos de cartas de condução, mas passado algum tempo disse que o número é de "apenas" 46 mil. Gosto do «apenas» como se 46.000 seja uma ninharia. Faz-me lembrar a anedota que corria entre os militares em que um sargento foi encarregado de dizer a um soldado recruta que tinha havido um desastre lá na aldeia e o pai tinha perdido a vida e foi-lhe recomendado para ser cuidadoso na forma como ia dar tão trágica notícia. Ele, na formatura, disse ao rapaz que lá na terra houve um acidente e morreu toda sua família e, depois de o soldado entrar num choro convulsivo, acalmou-o dizendo calma aí que só morreu o teu pai!

Num organismo com a responsabilidade do IMMT era de esperar que a preparação dos dirigentes fosse superior à de um sargento do século passado.

Mas o mais grave é que o desaparecimento de 46.000 pedidos de cartas não é uma pequena falha, não é um erro negligível. Causa transtornos a muita gente, afecta a confiança que a população deve ter nos serviços públicos. E a Microfil declina responsabilidades. Por isso, é de estranhar não haver ainda notícias de nenhum responsável ter sido sancionado, e a tutela não ter assumido a sua responsabilidade no caso. Parece que já foi esquecido o belo exemplo dado pelo então ministro Jorge Coelho que se demitiu quando ocorreu a queda da ponde em Entre-os-Rios.

Há pouco tempo um general francês, altamente colocado na hierarquia das Forças Armadas, demitiu-se porque num exercício, com numerosa assistência de civis, um soldado fez tiro com balas reais em vez de balas simuladas, tendo ferido mais de uma dezena de civis. O general não era obrigado a ir junto de cada soldado verificar o tipo de munições que tinha consigo, mas o seu sentido de honra e de eficiência levou-o a esses gesto brilhante. Mas, para Portugal, esse exemplo só prova a inocência doentia e antiquada dos Franceses que, coitados, até têm centrais nucleares, para produzir energia eléctrica!

Não. Não se deve brincar com erros tão evidentes do desleixo dos serviços públicos que conduzem à perda de confiança do povo nos seus governantes. Tais falhas não devem ficar impunes e os mais altos responsáveis devem tomar uma atitude de dignidade. Não deve repetir-se que um ministro continue em funções e elogie a construção de um aeroporto no deserto, onde disse que «jamé» isso aconteceria, em vez de ter confessado o erro, de forma idêntica à de Jorge Coelho e do general francês, ambos sem culpas pessoais nos casos que os levaram a tomar atitudes exemplares. Agora, quanto às cartas de condução, ficava bem, era de bom tom, alguém de alta posição imitar os dois exemplos citados.

4 comentários:

Jorge Borges disse...

E, contudo, apesar da demissão do ministro Jorge Coelho, no caso da ponte de Entre-Os-Rios, ninguém acabou por sair culpado!
O estado a que a Justiça chegou neste país permite aberrações deste tipo. Uma excelente Alternativa seria rever os códigos, as leis, o sistema judicial, para corrigir o que está errado. Um trabalho de fundo...

Um abraço

A. João Soares disse...

Caro Jorge,
Esse trabalho de fundo é necessário e urgente. E dele devem sair leis e o funcionamento da justiça absolutamente igual para todos. Quanto mais responsável maior deve ser o rigor das penas. E cada falha de um serviço deve ser sancionada, hoje que tanto se fala da avaliação de desempenho, há tanta incompetência a ser ignorada, com muita água benta. E isto acontece por o pessoal de direcção, em vez de ser admitido por concurso, é escolhido por amizades na Nomenklatura.
Abraço
João

José Lopes disse...

Meu caro, a culpa em Portugal é invariavelmente do porteiro ou da senhora da limpeza, mas nunca das mais altas instâncias que, essas são infalíveis e por isso mesmo recebem bons salários. O Coelhone foi uma excepção, como bem disse.
Cumps

A. João Soares disse...

O Jorge Coelho e o António Vitorino, são duas excepções que muito os dignifica no meio desta ausência de valores generalizada.
Outros já tiveram razões para lhes seguirem o exemplo e ficaram a assobiar para o ar: Sócrates, Mário Lino, etc.
Abraço
A. João Soares